Repressão ao Trabalho Escravo e Atendimento às Vítimas Resgatadas.
O Brasil
estar permeado por mazelas sociais graves e urgentes é preciso destacar que
somos internacionalmente reconhecidos como um país avançado no enfrentamento ao
trabalho escravo contemporâneo. Em primeiro lugar, por conta do próprio
reconhecimento da existência do mesmo no nosso território. Desde então, já
foram resgatadas dessas condições cerca de 40 mil pessoas. Nem perto desse
número estão os resgates de países, apenas a título de exemplo, como a Bolívia,
mas será que naquele território não existe trabalho escravo? A pergunta é
provocativamente reflexiva, para que se chame a atenção para a necessidade
primordial de aceitar a permanência do problema. O Brasil reconheceu e, em
segundo lugar, adotou, e vem adotando, diversas medidas erradicar o problema.
Destaque-se,
ainda, que o Brasil editou os Planos Nacionais para Erradicação do Trabalho
Escravo, nos quais encontraremos as metas estabelecidas e as instituições
(estatais, patronais, laborais, sociedade civil organizada) envolvidas com a
temática, sendo assim possível avaliar o que vem sendo de fato concretizado e
diagnosticar as falhas e lacunas ainda a enfrentar.
O cenário
de trabalho escravo vem mudando, pois vem crescendo os debates no Brasil acerca
das políticas migratórias e fatos circunscritos ao “antes”, aos aspectos que
levaram aquele trabalhador, brasileiro e estrangeiro, a migrar e findar por ser
superexplorado ou escravizado.
É preciso
redobrar a atenção, e consequentemente as ações protetivas e políticas
públicas, sempre que houver migração e/ou deslocamento dos trabalhadores de um
local para o outro, já que a exploração dessa condição poderá configurar
tráfico de pessoas para fins de trabalho, e, consequentemente, crime de
aliciamento.
Contudo é
importante traçar estratégias preventivas à exploração da condição migratória,
seja de brasileiros, seja de estrangeiros, e tratar com mais severidade e
acuidade os fatores que antecedem a constatação do trabalho escravo
contemporâneo: pode ter havido o tráfico de pessoas baseado numa intermediação
perversa da mão-de-obra, merecendo aqueles que dolosamente arregimentam futuros
trabalhadores escravos todo o rigor do sistema. Infelizmente muitos setores da
sociedade consideram “normal” para o trabalhador pobre, que poucas perspectivas
têm do trabalho, a aceitação de qualquer tipo de proposta ilusória e pagamentos
irrisórios.
As redes
de exploração que viabilizam o tráfico de pessoas para fins de trabalho são, no
mais das vezes, informais e pulverizadas, participando delas diversos sujeitos,
de forma mais ou menos intensa, em alguns momentos da arregimentação ou em
breve espaço de tempo e lugar.
Uma vez
traficadas essas pessoas, aliciada a mão-de-obra necessária, deparam-se, numa
imensa gama dos casos, com realidade de trabalho extremamente precária, sem
anotação de CTPS, sem alimentação adequada, sem banheiro, sem água, sem
alojamento, sem equipamento de proteção individual, jogados à própria sorte ou
praticamente em cárcere privado, algumas vezes já devendo o valor do transporte
e o adiantamento que foi lhe foi conferido com uma sedução ao trabalho no
momento da arregimentação.
A rede de
proteção existente e em expansão precisa se familiarizar e se aproximar das
definições e caracterizações do trabalho escravo contemporâneo, para pautar
ações preventivas, de acolhimento e de inclusão do trabalhador, que perpassam
na grande maioria dos casos de resgate de trabalhadores dessa condição pelo
tráfico de pessoas na origem.
Eis o
principal motivo da recente integração da DPU nos grupos móveis, justamente
para viabilizar. É importante após o resgate que seja realizada uma atuação
concentrada, promocional, focada na exigência de políticas públicas que
objetivem o acolhimento e a inclusão, ou reinclusão, social do trabalhador
resgatado das condições análogas a de escravo, ou de pessoas, ainda que nunca
reduzidas a tal condição, vulneráveis dentro do contexto socioeconômico em que
vivem, a partir da qualificação e/ou inserção em atividades que incrementem a
empregabilidade e concretizem a constitucional busca pelo pleno emprego, como
cursos de alfabetização, educação e profissionalização.
Imprescindível,
portanto, que estejamos aptos a detectar as situações de escravidão
contemporânea no Brasil, buscando além da punição aos infratores, o devido atendimento
às vítimas nesse chamado “pós”, ou até mesmo quando detectados nichos
vulneráveis, com acolhimento, transporte, concessão de seguro desemprego e
inserção em políticas públicas adequadas.
Eis o
desafio atual dos que lidam com a temática: avançar no enfrentamento ao
trabalho escravo contemporâneo no Brasil, indo além da repressão – seara na
qual detemos reconhecimento internacional – para que abarquemos também as
celeumas que margeiam o antes e depois desse crime, com a exigência e execução
de políticas públicas e ações arrojadas para prevenção e inclusão social dos
trabalhadores resgatados e/ou vulneráveis, para, só assim, conferir efetivas
liberdade e dignidade a esses seres humanos.
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